Se ficar o bicho come, se correr o bicho pega
Originalmente publicado no jornal SindSeg SP.
por Antonio Penteado Mendonça
Seguro é aquele investimento que as pessoas fazem para não usar. Não conheço ninguém em sã consciência ou honesto que tenha feito um seguro para usar. Você, com certeza, também nunca ouviu alguém dizer: “Legal, fiz meu seguro, vou bater meu carro”. A proposta não é essa, é o oposto. Seguro foi feito para proteger o patrimônio em caso de um evento, inesperadamente, atingir o bem segurado.
Aconteceu? Aconteceu. Então você avisa a seguradora que aconteceu um acidente e que você quer receber a indenização. Ela inicia o processo de regulação e, estando tudo bem, no final, que nos seguros comuns é rápido, paga a indenização.
Os dois seguros referências para isso são o seguro de vida e o seguro de veículos. Nos dois, a documentação entregue e o resto estando “nos conformes”, a seguradora paga rapidamente. Aliás, no seguro de veículos, nas perdas parciais, normalmente o segurado não faz nada – não paga, nem recebe. A seguradora regula e paga diretamente a oficina pelos reparos realizados. E a regra vale para o segurado e terceiros envolvidos no acidente.
Até aqui tudo bem. Só que parte disso deixou de ser verdade porque, depois da pandemia do coronavírus, o mundo virou de ponta cabeça. Começaram a faltar semicondutores para os carros novos; na sequência, começaram a faltar peças em geral e aí o samba atravessou.
Raramente a reparação de um carro levava mais do que dez dias. A seguradora recebia o aviso, fazia a vistoria, aprovava o orçamento e em três dias a oficina tinha autorização para realizar os serviços, que demoravam mais ou menos uma semana, a não ser em acidentes mais graves, quando a demora podia ser maior.
Hoje está bem mais complicado. Não é difícil um automóvel ficar parado mais de um mês numa oficina, que não consegue concluir os reparos porque simplesmente não encontra as peças necessárias no mercado.
Não, não imagine que isso só acontece com carros importados ou com veículos fora de produção. Aliás, em relação a esses é importante lembrar que as montadoras e importadoras devem garantir a reposição das peças de reposição por um prazo razoável de tempo, nos termos do Código de Defesa do Consumidor (CDC). O CDC não define o que é o prazo razoável, mas a justiça tem entendido que não pode ser menor do que a expectativa de vida útil do bem.
Só que o problema vai além e afeta veículos ainda em produção. Simplesmente não há determinadas peças originais para reposição e tem sido mais comum do que o razoável carros ficarem parados porque nem a seguradora, nem a oficina encontram as peças para terminar os reparos. Dizer que a demora é culpa das seguradoras não faz sentido. Seguradora não fabrica peças, ela paga indenizações. Então, não tem como responsabilizá-la pela falta dos produtos no mercado.
Mas será que a regra se aplica à montadora ou importadora do veículo? Me parece que não. O problema é que a solução do caso pode levar muito tempo e aí o proprietário do veículo para o qual não tem peças de reposição, independentemente de ter contratado um seguro para proteger seu patrimônio, vai ficar a pé até alguém, de alguma forma, encontrar uma saída para ele.
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