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Crônicas & Artigos

em 01/12/16

O seguro, a lei e a vontade das partes

Originalmente publicado no jornal Tribuna do Direito.
por Antonio Penteado Mendonça

A operação de seguro é das mais eficientes ferramentas de proteção social. Com mais ou menos quatro mil anos de idade, as primeiras regulamentações foram gravadas em tábuas de escrita cuneiforme, na antiga Mesopotâmia. Já apresentavam os princípios básicos da operação moderna, com a divisão proporcional dos prejuízos como grande mote para a manutenção do equilíbrio social, especialmente nas operações das caravanas, onde as perdas dos participantes não eram necessariamente semelhantes.

Daí para frente, o seguro é encontrado como suporte para o comércio das Repúblicas Italianas; em Portugal, a partir de 1350; espalhado pela Europa renascentista; como base para a construção do império, na Grã-Bretanha do século 18; depois do grande incêndio de Londres, no século 19; nas proteções sociais da Alemanha de Bismark, etc., sempre aumentando sua abrangência e estendendo sua proteção para campos inéditos, até os dias, quando praticamente tudo pode ser segurado.

As bases do seguro são a legislação aplicável, as estatísticas e a matemática. Com elas, a seguradora pode oferecer proteção para a sociedade, garantindo o pagamento das indenizações decorrentes de eventos pré-determinados no contrato.

No mundo inteiro o seguro segue normas mais ou menos semelhantes, que permitem a viabilização do negócio, oferecendo a proteção desejada pela sociedade para proteger-se de perdas capazes de afetar alguns de seus componentes. O segredo da eficácia do seguro é a proteção individual, suportada pelo grupo, mediante a contribuição proporcional ao risco, feita por cada um de seus integrantes.

O contrato de seguro é um contrato bilateral, oneroso, de adesão parcial, nominado e da mais estrita boa-fé. Ele dispõe as condições para a utilização parcial de um mútuo formado pelas contribuições dos segurados para minimizar determinadas perdas pré-estabelecidas que atinjam alguns dos integrantes do grupo.

Por sua importância social, pela ordem dos recursos movimentados, pela aleatoriedade da ocorrência dos eventos cobertos, pelas consequências danosas da quebra de uma seguradora, o negócio do seguro é altamente regulado pelos governos, independentemente da matriz ideológica do país.

O Brasil não é exceção. O setor de seguros é dos mais regulados da economia, com duas estruturas inteiramente dedicadas a ele, a saber a SUSEP (Superintendência de Seguros Privados), que cuida dos seguros gerais, seguros de pessoas, planos de previdência privada aberta e capitalização, e a ANS (Agência Nacional de Saúde Privada), responsável pelas operadoras dos planos de saúde privados.

Como arcabouço legal, o Decreto-lei 73/66 normatiza o Sistema Nacional de Seguros Privados, a Lei 9656/98 regulamenta a operação dos planos de saúde privados e o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor se encarregam do contrato de seguro no mundo real. Além destas, outras leis e toda uma extensa regulamentação infra legal, menos visíveis, também tratam da matéria.

Um dos pressupostos dos contratos é a vontade das partes. Em alguns países esta vontade é ilimitada, podendo inclusive modificar a lei. No Brasil não é assim. A vontade das partes é, evidentemente, importante para a materialização de um contrato, mas ela é limitada pela lei. Assim, por mais vontade que as partes tenham de contratar de uma determinada maneira, se a lei impedir ou se o contrato for de encontro a ela, o negócio não tem validade legal, o que leva, na maioria das vezes, à sua não realização, porque, caso ele fosse concluído, seria nulo ou anulável.

É assim que o artigo 757 do Código Civil determina que “pelo contrato de seguro o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou coisa, contra riscos predeterminados”. E seu parágrafo único vai além, impondo como condição básica para a realização do contrato o segurador ser entidade legalmente autorizada.

Não é necessário ir além para se verificar que a vontade das partes é extremamente limitada. A começar por quem pode contratar (seguradora), passando pela natureza do objeto do contrato (interesse legítimo do segurado) e terminando nos riscos segurados (predeterminados), a lei se encarrega de balizar o negócio de forma rígida. O que não se deve impedir é a realização de negócios lícitos, respeitadas suas premissas.

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