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Crônicas & Artigos

em 01/10/16

O limite das limitações

Originalmente publicado no jornal Tribuna do Direito.
por Antonio Penteado Mendonça

Até que ponto as cláusulas limitadoras das garantias das apólices de seguros são válidas ou eficazes? Dentro de uma visão de respeito absoluto à vontade das partes, em princípio, o que estivesse escrito no contrato deveria prevalecer sobre todas as outras regulamentações, justamente por representar a vontade das partes. Mas esta visão seria exagerada e fora da realidade, em primeiro lugar, porque há regras mais fortes que a vontade das partes e, em segundo lugar, porque nos contratos de adesão, ainda que relativa, como é o caso do contrato de seguro, nem sempre o que está escrito exprime integralmente a vontade dos dois contratantes.

Em avenças onde a negociação é livre e equilibrada, normalmente as partes acordam, cedendo parcialmente em suas reivindicações. Nos contratos de seguro isso não acontece. O segurado não tem o poder de contratar exatamente o que ele deseja, da forma como ele o deseja. As apólices, ainda que permitindo alguma flexibilidade nas cláusulas a serem adotadas e nos valores contratados, são documentos com disposições padronizadas, nas quais a seguradora define as garantias, o grau de abrangência e o preço.

É assim que o contrato de seguro deve ser lido com ênfase especial nas Exclusões de Cobertura, nos Bens não Cobertos e nas Perdas de Direito. São estas três cláusulas que vão pautar o comportamento da seguradora no processo de regulação do sinistro e pagamento da indenização.

São cláusulas impositivas e impostas ao segurado pela seguradora. Pode haver a possibilidade de se contratar a apólice com maior ou menor abrangência, incluindo ou excluindo coberturas, mas, a partir da definição do que estará ou não coberto, não há como o segurado alterar o contrato, adaptando-o ao seu caso em particular. A seguradora não transige com fórmulas fora do padrão de suas Condições Gerais, Especiais e Particulares.

As Condições Gerais são as condições aplicáveis a todos os seguros de um mesmo ramo. Elas podem ser modificadas pelas Condições Especiais, desenhadas para um determinado tipo de risco, dentro do ramo. Já as Condições Particulares são as que individualizam as apólices, permitindo que o segurado altere as Condições Gerais e as Particulares, mas limitado ao clausulado oferecido pela seguradora.

É neste contexto que as limitações das garantais precisam ser analisadas e avaliadas, até para verificar se fazem algum sentido, dentro da razão de ser do seguro, que é a transferência da obrigação do pagamento da perda econômica consequente de um determinado evento previsto no contrato do segurado para a seguradora.

Além disso, o contrato está limitado pela legislação. Assim, o clausulado não pode limitar ou alterar direito que a lei garante. Se dispuser neste sentido, a cláusula é nula ou anulável.

Ponto altamente relevante nas relações de seguros é a boa-fé, que é igualmente impositiva para o segurado e para a seguradora.

Assim, um seguro que se propõe a garantir a indenização para um determinado tipo de risco não pode ter entre suas cláusulas uma que exclua das coberturas exatamente o risco que se pretende segurar.

Seria uma apólice de seguro de automóvel determinar que os acidentes envolvendo o veículo segurado não estariam cobertos. Exposto desta forma fica evidente a contradição, mas se a exclusão for parcial, ou não tão evidente, há a possibilidade de a seguradora limitar, além do que lhe faculta a lei, o seu dever de indenizar.

A discussão não se confunde com situações em que a não cobertura se impõe, como nos casos de infringência da lei ou agravação do risco pelo segurado. Seguro não existe para recompensar o crime, nem para avalizar o deliberadamente mal feito. Sua missão é indenizar perdas resultantes de acidentes que causam prejuízos ao segurado. Assim, é indispensável a relação direta de causa e efeito entre o risco oferecido e a garantia contratada.

Na medida que a seguradora é a especialista no negócio, não seria admissível, por exemplo, ela oferecer uma apólice de seguro de transporte para garantir o risco de incêndio e, depois, negar a indenização com base na contratação da apólice errada.

Cada caso é um caso, mas o bom senso e a lógica desempenham papel relevante, que, no universo do seguro, adquirem ainda maior importância, limitando a capacidade da seguradora impor limites ao seu dever de indenizar.

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