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Crônicas & Artigos

em 21/12/18

Eles não têm seguro

Originalmente publicado no jornal SindSeg SP.
por Antonio Penteado Mendonça

De acordo com o IBGE, o Brasil tem cinquenta e quatro milhões de pessoas na pobreza e quinze milhões na miséria. Um terço dos brasileiros, ou sete vezes a população de Portugal vivem marginalmente, praticamente excluídos da sociedade.

Este enorme contingente não está apenas no Nordeste ou no Norte do país, onde tradicionalmente as condições de desenvolvimento são mais precárias. As periferias das grandes cidades estão tomadas por favelas e bairros populares um pouco melhores do que elas. Lá, milhões de brasileiros vivem sem assistência à saúde, assistência social, escolas, saneamento básico, policiamento, iluminação pública e o mais essencial para dar um mínimo de dignidade a vida.

Grosso modo, setenta milhões de brasileiros não ganham o necessário para terem um padrão de vida minimamente aceitável. Eles sobrevivem da forma que podem e têm poucas chances de oferecer um futuro melhor para os filhos.

Suas moradias são precárias, invariavelmente amontoadas umas sobre as outras, ocupando áreas de risco, sujeitas aos estragos causados pelos fenômenos naturais ou incêndios que se espalham rapidamente.

Será que vivem assim porque escolheram viver assim? É evidente que não. Eles não têm outra possibilidade, então é pegar o que tem e se dar por satisfeito de ao menos ter um arremedo de teto sobre suas cabeças e frágeis paredes para se protegerem do tempo.

A simples existência de algumas favelas excepcionalmente pobres, normalmente erguidas ao lado das ferrovias, leva a pensar qual seria condição de vida que parte desta população tinha em seus estados de origem. Ninguém mora num barraco de papelão e lata se tiver chance de encontrar um lugar um pouco melhor.

O resultado da promiscuidade forçada que estes brasileiros são obrigados a suportar pode ser visto na quantidade crescente dos incêndios que atingem e destroem centenas de barracos em poucas horas, sem que ninguém tenha condições de controlar o fogo.

Estes acidentes são terríveis não apenas porque matam e ferem pessoas, mas porque a maioria das vítimas perde o pouco que tinha e simplesmente não tem qualquer tipo de reserva para recomeçar a vida fora da miséria.

O cidadão que progrediu um pouco e de catador de papel se transformou em pequeno comerciante, dono de uma biboca onde vende sanduiche de mortadela e cerveja no fundo da favela, ao ter a biboca atingida pelas chamas não tem reserva ou recursos para reconstruir o pequeno bar e é obrigado a voltar às ruas, puxando seu carrinho e catando o que encontra para garantir o sustento da família.

A grande diferença entre este cidadão e uma grande empresa é que as empresas contratam seguros e se protegem das perdas decorrentes dos eventos que as atingem, enquanto o dono do pequeno bar no fundo da favela, ao ser atingido, perde tudo e não tem apoio social, ou seguro que lhe permita com a indenização reconstruir a biboca.

Mas não é apenas o seguro do barraco ou do pequeno negócio que não existe. Não existe seguro de vida, seguro de acidentes pessoais, seguro de acidentes do trabalho, seguro prestamista para fazer frente as dívidas mais pesadas, ou qualquer outro tipo de proteção que garanta a família o mínimo para tocar a vida, depois de uma perda de vulto.

Estas pessoas não contratam seguro porque os produtos do setor estão completamente fora de sua realidade. Muitas nunca ouviram falar de seguro, quanto mais da possibilidade de contratar uma apólice. Outras até podem saber que existe alguma coisa no gênero, mas as necessidades essenciais da vida – comer, se vestir, um ou outro desejo, por menor que seja – consomem os seus parcos recursos, quando não ainda fica faltando algum para fechar o mês.

O Brasil é uma das maiores economias do mundo, mas as bênçãos desta situação não beneficiam toda a população. Enquanto o país não investir pesadamente na redenção de milhões de cidadãos sem chance de prosperar, por falta de saúde, escola, moradia, segurança, etc., há muito pouco que se possa fazer para mudar o quadro trágico. Que ainda por cima não conta com o seguro para minimizar os prejuízos.

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